Tá ficando velha!
Duas velhinhas estão sentadas em suas cadeiras de balanço, tricotando e com uma mantinha no colo. Elas conversam com seus netos e bisnetos que estão ali à frente, quando um neto levanta e diz:
– Vamos dar uma volta conosco, vovós?
– Oh não, meu filho, não vou… Estou com minha trombose tão dolorida que não me aguento! – disse dona Débora.
– Eu também não quero ir, queridos… Minhas costas doem horrores por causa dessa osteoporose… – completou dona Priscilla.
– Ahhh… Então nós vamos embora agora, vovós. Mas cuidem-se, amanhã voltaremos. – as senhorinhas sorriem enquanto são beijadas nas bochechas murchas por todos ali presentes. Todos foram embora.
As duas permanecem quietinhas por uns minutos, e aí dona Prih diz:
– Já foram, Dé?
Dona Débora olha ao redor e responde sorrindo marotamente:
– Já!
– Vou pegar nossas roupas e os saltos, você pega a maquiagem e os acessórios!
– Certo, Prih!
As duas correm enlouquecidamente pela casa, sem preocupar-se em fazer barulho, dona Débora pega a maquiagem e coloca tudo na penteadeira, pega o babyliss e sai para pegar o resto dos acessórios que irão usar. Dona Priscilla pega os vestidos, os saltos e as meias-finas, trás tudo pra perto da penteadeira e dá de cara com dona Débora voltando. As duas riem.
– Eles demoraram pra ir embora hoje, hein?! – disse dona Prih.
– Verdade, achei que nunca mais iam nos deixar! – dona Dé concordou e sorriu enquanto vestia-se.
As duas maquiaram-se e vestiram-se, dona Prih com seu jeans colado, sua camisa do Nightwish e seus saltos bem altos. Dona Dé vestiu-se com uma calça colada de couro preto, uma camisa do Iron Maiden que tinha um decote enorme na região dos seios e suas botas estilo hard rock. Ambas estavam lindas, prontas para matar!
– Vai esquentando a Linda enquanto eu pego as jaquetas e tranco a casa, Dé.
Dona Dé foi até a garagem, tirou o tecido branco que cobria sua Harley Davison (a Linda), e levou-a pra fora. Dona Prih chegou com as jaquetas de couro e elas vestiram, logo em seguida subindo na moto. Colocaram os capacetes (com cuidado pra não bagunçar os cabelos) e foram em direção ao Forasteiros Rock Bar, que mesmo com as tendências coloridas da época, ainda era todo escuro e só tocava rock do bom!
Quando chegaram, tocava KISS – I love it loud. As duas já adentraram o recinto balançando a cabeça, acompanhando a música.
– Vou pegar as cervejas e as fichas, escolhe a mesa que já subo. – disse dona Dé. Virando-se para o caixa, fez o pedido.
– Está linda hoje, dona Débora! E a dona Priscila também… Duas gatas, vocês! – disse o atendente, um jovenzinho de vinte e um anos, muito bonitinho.
– Obrigada, Joe, obrigada! – dona Dé piscou de leve e pegou as duas cervejas, os dois copos e mais um punhado de fichas.
Subiu as escadas e encontrou com dona Prih, que estava sentada a uma mesa, apenas observando o jogo de sinuca de uns meninos à frente. Dona Dé serviu-as de cerveja e já foram logo ocupar uma mesa de sinuca. Jogaram por horas e depois de muito rir e fazer amizades, voltaram à sua mesa.
– A noite está sendo ótima, Dé! Nunca me diverti tanto! Todo ano fazemos algo diferente, mas esse ano está excepcional!
– Então vamos ao brinde! – dona Dé estendeu o copo cheio de cerveja e todos no recinto fizeram o mesmo. – Esta noite quero brindar à uma amiga que sempre esteve presente em todos os momentos de minha vida (ou ao menos em vários deles!): Prih, minha amiga aqui, no Japão, em Marte, em qualquer lugar!
Dona Prih abraçou sua amiga e as duas entornaram o copo cheio de cerveja. Todos aplaudiram e logo beberam suas cervejas também.
– E tem mais… – todos olharam para dona Dé – Hoje a cerveja é por conta… – dona Prih sorriu e ia gritar de alegria, quando dona Dé completou – Por conta da Prih! – dona Prih deu um tapa na cabeça de dona Dé, que riu.
A festa não parou por aí. Quando estava quase tudo sendo fechado, decidiram colocar uma última música, para relembrar os velhos tempos: Wish I had an angel, da tão amada Nightwish. Dançaram enlouquecidamente, junto com todos em volta! Dona Dé olhou no relógio e arregalou os olhos.
– Prih! Tá na hora, amiga, corre! – dona Prih e dona Dé despediram-se de todos no recinto e subiram em Linda, terminando assim, a noite de sonhos proibidos.
Chegaram em casa às cinco da manhã, correndo para guardar tudo o que podiam. Esconderam Linda debaixo do pano branco no fundo da garagem de novo, guardaram as maquiagens na nécessaire, tiraram as roupas e enfiaram dentro do guarda-roupas num cantinho escondido e deitaram-se, cada uma em sua cama.
– Daqui duas horas eles estarão aqui! – disse dona Prih.
– Não podemos deixar nenhum vestígio! – completou dona Dé.
Acabaram pegando no sono, sendo acordadas exatas duas horas depois por seus netos e bisnetos, que traziam um bolo enorme de aniversário para dona Prih.
– Parabéns pra você… – cantaram todos, acordando as duas senhorinhas.
Mais tarde, após o bolo, os docinhos e a música em volume ambiente para não prejudicar os aparelhos auditivos das velhinhas, todos iam deixando-as sozinhas em casa, despedindo-se com beijinhos e braços, e felicitações pelo aniversário de 79 anos de dona Prih.
Ao saírem todos, as senhorinhas recostaram-se ao sofá e suspiraram.
– Eles não descobriram nosso segredo… Ainda bem! – sussurrou dona Prih.
– Ufa! Estou cansada… Ai, minha coluna… Vamos dormir, querida… Vamos dormir. – dona Débora levantou do sofá com dificuldade, segurando as costas doloridas e dona Prih levantou-se também. Ambas deitaram-se em suas camas macias, perfeitas para relaxar os corpos idosos das duas. E assim acabou a noite mais maluca da vida das duas.
E para completar, uma nota da autora:
– Prih… Aqui é a Dé. Viu, eu queria te dizer uma coisinha: você é a pessoa que mais me cativou. Me faz feliz ter sua amizade, mesmo que o tempo passe e nós duas viremos duas velhas caquéticas que curtem jogar sinuca ouvindo Nightwish, sempre seremos unidas. Mesmo com a distância! Obrigada por estar sempre ao meu lado, te prometo estar ao lado do seu sempre! Te amo, doida!
Juntas pra sempre ;D